O finale da Girl from Ipanema

Morreu na última segunda-feira (05) a cantora Astrud Gilberto, responsável pela icônica gravação de Garota de Ipanema do disco Getz/Gilberto. A cantora teve um mal-estar digestivo e pouco tempo depois faleceu em decorrência de problemas do coração em sua casa, na Filadélfia. Astrud vivia com seus filhos João Marcelo Gilberto, filho de seu casamento com o cantor João Gilberto, e Greg Lasorsa, fruto do seu segundo casamento com o empresário estadunidense Nicholas Lasorsa. A cantora tinha 83 anos.

Apesar de inspirada na modelo Helô Pinheiro, no exterior é consenso que a tal Garota de Ipanema é uma moça de voz doce, que sequer nasceu no Rio de Janeiro. A soteropolitana Astrud Gilberto nasceu em 1940, filha de uma brasileira com um alemão, e se mudou para o Rio ainda criança. Sua melhor amiga na adolescência, Nara Leão, incentivou a baiana a cantar e também a apresentou ao seu futuro marido, João Gilberto. Eles se casaram em 1959 e menos de um ano depois já esperavam um filho.

Sua primeira apresentação foi em 1960, no palco do Anfiteatro da Escola de Arquitetura da UFRJ. Cantou ao lado de nomes como Johnny Alf, Nana Caymmi e Elza Soares num show organizado para celebrar o lançamento do segundo disco de João Gilberto, O Amor, O Sorriso e a Flor.

Em 1963, se mudou com João para os Estados Unidos, e lá acompanhou o marido nas gravações do emblemático disco Getz/Gilberto. As sessões foram tensas, com inúmeras discordâncias entre os dois artistas, mas havia um consenso: The Girl From Ipanema devia ser cantada em inglês. João não dominava o idioma, então coube a Astrud assumir esse posto, que com um canto tímido e minimalista, acabou definindo toda a sonoridade do vocal feminino na bossa nova estrangeira: sussurrado, elegante e sóbrio.

O disco foi um sucesso, vendendo mais de dois milhões de cópias em 1964 e ocupando a segunda posição da Billboard por quase 2 anos, perdendo somente para o Hard Day’s Night, dos Beatles. O disco também levou quatro Grammys em 1965, incluindo o de Melhor Gravação do Ano, para The Girl From Ipanema. Astrud Gilberto foi a primeira mulher da história a levar esse prêmio, além da primeira brasileira a ganhar um Grammy. Ela chegou a ser indicada a Melhor Performance Feminina, mas perdeu para Barbra Streisand, e também Artista Revelação, que acabou ficando com os Beatles. Ela recebeu ainda um Grammy Latino em 2008 pelo conjunto de sua obra.

Apesar do sucesso de Garota de Ipanema, 1965 foi um ano duro para a cantora. Havia sido mal remunerada pela sua performance, ganhando somente o cachê mínimo instituído pelo sindicato dos músicos dos EUA, U$120, e sequer foi creditada na ficha técnica da primeira prensagem do Getz/Gilberto. A baiana havia também recém se divorciado de seu marido, com um filho para cuidar e ainda se adaptando à vida em outro país. Foi neste contexto conturbado que surge seu primeiro disco solo, The Astrud Gilberto Album. Mesmo com todas as dificuldades, o álbum foi um sucesso, com hits como Água de Beber e Só Tinha de Ser Com Você.

Dos anos 1970 em diante, Astrud passou a trabalhar com um repertório autoral fazendo turnês por todo o mundo e tornando-se um dos mais conhecidos nomes da música brasileira no exterior. A cantora recebeu em 1992 o prêmio Latin Jazz USA pelo conjunto de sua obra, além de ser incluída no International Latin Music Hall of Fame em 2002. Depois de tirar uma “folga por tempo indeterminado” dos palcos no mesmo ano, a baiana passou a se dedicar aos seus trabalhos como artista plástica, além do seu ativismo pelos direitos dos animais.

A ascensão de Astrud Gilberto foi meteórica. Em um espaço de apenas 5 anos, a cantora foi de sua primeira performance até o “Oscar da música”. A cantora fez um carreira sólida no exterior, sendo mais conhecida lá fora do que no seu país de origem, e tornando-se um dos principais símbolos da música brasileira em todo o mundo.