Todos os meses, a equipe editorial da Qobuz identifica os discos imperdíveis lançados em todos os gêneros. Confira aqui a seleção de janeiro de 2024.

ROCK & ALTERNATIVO

Sem querer nos aventurarmos em previsões astrológicas de bar, mas com este mês de janeiro, já podemos afirmar com certeza que o ano de 2024 se coloca sob o signo da abundância. Já no dia 5, o quarteto irlandês Sprints conquistou nosso Qobuzissime com seu primeiro álbum Letter to Self, uma bela mistura de garage-punk com letras engajadas. Na semana seguinte, Bill Ryder-Jones lançou, após cinco anos de ausência, sua obra-prima de pop orquestral Iechyd da. No dia 26, uma avalanche de lançamentos: The Smile retorna com os sublimes arranjos de Wall of Eyes, Ty Segall adiciona o excelente Three Bells à sua prolífica discografia e os norte-americanos do Future Islands continuam nos fazendo dançar com o sintético People Who Aren’t There Anymore. Na mesma data, nosso coração se derreteu pelo belo trabalho folk em três atos The Pilgrim, Their God and the King of My Decrepit Mountain, do ainda pouco conhecido quinteto londrino Tapir!. Uma odisseia luminosa atravessada por coros e cordas emocionantes, que recomendamos calorosamente.

JAZZ

Início de ano exuberante no mundo do jazz, com destaque neste mês de janeiro para gêneros diametralmente opostos: o minimalismo virtuoso da cantora sul-coreana Youn Sun Nah em duo com o tecladista Jon Cowherd (Elles); o novo álbum da guitarrista norte-americana de vanguarda Mary Halvorson à frente de seu maravilhoso sexteto Amaryllis (Cloudward), o primeiro álbum épico e fusion do jovem grupo francês Bada-Bada (Portraits) e o encontro geracional de dois titãs do piano Michael Wollny & Joachim Kühn (Duo). Além desses, dois lançamentos da ECM também merecem nossa atenção: o segundo álbum delicado do saxofonista francês Matthieu Bordenave (The Blue Land) e a jornada onírica e sensual do trompetista norueguês Arve Henriksen em duo com Harmen Fraanje (Touch of Time).

No jazz moderno dos EUA, o pianista Ethan Iverson lançará em trio seu segundo álbum para o selo Blue Note (Technically Acceptable) e a saxofonista Amanda Gardier apresentará seu terceiro álbum como líder, inspirado no universo cinematográfico de Wes Anderson (Auteur: Music Inspired by the Films of Wes Anderson).

O selo ACT, sempre ativo, apresentará o novo e groovy álbum do jovem saxofonista Jakob Manz, estrela da nova cena alemã (Answer), e em um registro mais íntimo, o encontro de duas grandes figuras do jazz polonês, o violinista Adam Bałdych e o pianista Leszek Możdżer (Passacaglia). Para encerrar este panorama que é quase uma volta ao mundo, o guitarrista brasileiro Fabiano do Nascimento e o saxofonista norte-americano Sam Gendel oferecerão em The Room uma interpretação inspirada de músicas folclóricas de diversas regiões da América do Sul. A universalidade do jazz em todas as suas facetas!

MÚSICA CLÁSSICA

O ano de 2024 se inicia com uma elegante interpretação das Béatitudes, um oratório um tanto esquecido de César Franck. Sob a regência de Gergely Madaras, o novo diretor da Orquestra Filarmônica Real de Liège, encerra-se com beleza dois anos dedicados ao bicentenário do compositor. No dia 12, a grande sacerdotisa do piano concertante, Elisabeth Leonskaja, retornou a seu selo histórico, a Warner Classics, para uma seleção de concertos de Schumann e Grieg - um programa que atravessa o romantismo e pós-romantismo, apresentado pelo estilo à moda antiga dessa pianista imensa. Em 19 de janeiro, na Sony, encontramos a violoncelista Sol Gabetta, desta vez em duo com Bertrand Chamayou, para um álbum duplo com um programa rico e variado, entrelaçando as Variações concertantes de Mendelssohn com olhares mais contemporâneos sobre as Romances sem Palavras, confiadas aos compositores Heinz Holliger, Wolfgang Rihm e Francisco Coll. Finalmente, em 26 de janeiro, não se pode perder na Bru Zane a ópera esquecida de Louise Bertin, uma verdadeira pérola romântica apresentada aqui pelos virtuosos músicos dos Talens Lyriques e do Flemish Radio Choir.

MÚSICA ELETRÔNICA

Foi o produtor francês Fakear quem deu o pontapé inicial em 2024 com seu novo álbum Hypertalisman, no qual ele retorna às suas raízes, entre batidas suaves, vocais cortados e sintetizadores arrepiantes. Na Inglaterra, o selo Brownswood, liderado por Gilles Peterson, lançou um EP do multi-instrumentista ganense Delasi, Audacity of Free Thought, um disco que carrega bem o seu nome nos confins do jazz, soul, hip-hop e música eletrônica, como na bela faixa “Amplifier” com o saxofonista Nii Noi Nortey. Vale a pena também ouvir o novo álbum LIBEROSIS do prolífico Canblaster, que já havia marcado o final de 2023 com sua mixtape GENESIS. Um álbum bastante contemplativo em três capítulos, sendo que o ACT 1 foi lançado em janeiro, mixado por Steve Dub, o engenheiro de som dos Chemical Brothers. Por fim, o último álbum de Lou Reed, Hudson River Wind Meditations, foi relançado neste mês de janeiro pelo selo Light in the Attic. Uma oportunidade de redescobrir um álbum ambiental em forma de jornada espiritual, longe dos tumultuados anos do rock do líder do Velvet Underground.

SOUL/R&B

O destaque R&B deste início de 2024, se é que podemos reduzi-lo a um gênero, é o álbum Orquídeas de Kali Uchis, que na verdade incorpora muito mais da pop sul-americana e das imagens da Movida espanhola do que dos derivados da soul music. A colombo-americana de 29 anos entrega um álbum verdadeiramente significativo, moderno, não sensacionalista, que contribui de maneira única para definir o futuro do pop. Em um estilo muito mais clássico, o álbum Keep It To Yourself do grupo The Tibbs se insere em um rhythm & blues herdeiro dos anos 1960, por vezes um pouco clichê, mas que maneja muito bem os códigos do gênero e encontra, na vocalista Elsa Bekman, uma líder impressionante.

Há também a compilação intitulada Crate Diggers Supreme: Lost Vinyl Oddities & Break Beats 1965-1985, Vol.1, que, como o próprio nome sugere, se concentra em 20 anos de soul, funk e derivados, na grande tradição de discos destinados a serem sampleados por artistas de hip-hop. Sejam sampleadas ou não, essas músicas geralmente estão repletas de preciosidades. Aqui, os destaques são as faixas “Nadia” de Frederic Talgorn ou “Thief of Baghdad” de Lee Erwin (que os fãs do rapper Nas certamente reconhecerão), mas essa seleção curta de oito faixas não contém nenhum deslize.

Para concluir, Keyon Harrold, cantor e trompetista muito orientado para o jazz, se aventura por diversos formatos, incluindo soul e R&B, em seu novo álbum Foreverland, repleto de emoções e desejo por sutilezas, com participações de Common, Laura Mvula, Robert Glasper e Chris Dave.

METAL

O ano do metal começa da maneira mais eclética possível, com os artistas lançando suas novidades destinadas a limpar os ouvidos ainda amortecidos pelos excessos das festas. Os fãs do heavy metal no sentido clássico da palavra ficarão animados com o retorno do Saxon com Hell, Fire And Damnation, dois anos após seu Carpe Diem que conquistou todos os votos. Sempre vintage, mas com uma inclinação mais para o hard rock, a dupla Russell / Guns lança seu primeiro álbum Medusa, um encontro entre a voz do Great White e a guitarra do L.A Guns. Os saudosos do metal dançante com contornos neo do Static-X olharão de maneira curiosa e intrigada para o Project Regeneration, Vol. 2, o segundo volume lançado dos arquivos e composto por músicas gravadas com o falecido criador e vocalista, Wayne Static, e a formação original da banda.

No cenário do metal progressivo, os australianos do Caligula’s Horse, no auge de sua arte, retornam com Charcoal Grace, prova de sua perfeita maestria em um estilo que conseguem tornar acessível graças a um verdadeiro senso de melodia. Por fim, um destaque obrigatório após um primeiro álbum brilhante, não deixe passar despercebido o promissor Fission do Dead Poet Society, uma mistura habilmente dosada entre rock alternativo, riffs ultra pesados e acentos pop sempre equilibrados.

RAP & HIP-HOP

Novo ano, nova chuva de lançamentos no rap norte-americano, começando com um álbum de Kevin Gates, blockbuster melódico e sem reservas, intitulado The Ceremony. Um álbum muito singular que se destaca de seus dois primeiros, mas que sem dúvida se impõe como o mais introspectivo até agora. Já 21 Savage lança o cínico American Dream, ainda assombrado pelo passado e que, no auge do sucesso, não para de buscar a luz. Certamente um de seus melhores projetos até o momento. Kid Cudi, por sua vez, faz jus à sua reputação de artista inclassificável com o muito bem-sucedido Insano, sobre o qual paira a influência de Kanye West, certamente, mas que também revela muito sobre os questionamentos existenciais do nativo de Cleveland, menos otimista e mais cheio de dúvidas do que o habitual.

BLUES/COUNTRY/FOLK

A boa notícia deste início de ano é o retorno de Ramsay Midwood. Até hoje ouvimos Shoot Out at the OK Chinese Restaurant, seu primeiro álbum lançado em 2000, uma síntese perfeita de americana bluesy e boogie, à la JJ Cale. Desde então, Ramsay Midwood tem estado mais discreto, frequentando principalmente a área de Austin e o bar de música Sam’s Town Point, seu quartel-general. É onde ele toca com frequência, e foi lá que ele gravou seu álbum ao vivo Manchaca Eyeball, que também continuaremos ouvindo daqui a vinte anos.

Tão autêntico e revigorante, Justin Golden refresca o folk-blues acústico em seu primeiro álbum Golden Country, Volume 1. Tocado em grupo e inspirado no blues do Piedmont e no bluegrass, é o tipo de receita infalível. E como este álbum é subtitulado Volume 1, já podemos nos alegrar aguardando o segundo. Ainda no universo do blues, mas para acordar e se animar um pouco, podemos contar com The Hard Line, o novo disco do gaitista e cantor Chris O’Leary. Na pura tradição do Chicago blues elétrico, cheio de emoção e energia.