Como um país de forte cultura literária, berço de alguns dos maiores escritores da história da humanidade, não é de se espantar que Portugal tenha um brilhante cancioneiro. Apesar do fado ter sido tão popular no país na primeira metade do século XX, a música portuguesa se reinventou depois da Revolução dos Cravos, em 1974. A queda do salazarismo deu fim ao serviço de censura do governo autoritário, abrindo espaço para novos artistas e para alguns dos principais marcos da música portuguesa. Selecionamos aqui 5 discos clássicos para quem quer adentrar na música portuguesa.

Amália Rodrigues - Com Que Voz

É impossível não começar essa lista sem o maior expoente da música de Portugal. A rainha do fado Amália Rodrigues vendeu mais de 30 milhões de discos, apresentou-se ao redor do mundo e até mesmo estampou a capa da revista estadunidense Billboard, em 1954. Foi Amália quem deu voz a poemas musicados de Luís de Camões e D. Dinis, ao mesmo tempo que gravou letras de poetas mais contemporâneos como Pedro Homem de Mello e Manuel Alegre.

Seu disco Com Que Voz, lançado em 1970, é considerado uma de suas principais obras, encerrando uma década de ouro para a cantora. Seu velho companheiro, Alain Oulman, foi o responsável pela composição das músicas sobre poemas de poetas como Cecília Meireles, Mourão-Ferreira e Alexandre O’Neill. Com Que Voz é marcado por algumas das melhores interpretações de Amália e pelo seu acompanhamento instrumental composto somente por violão e viola. O álbum ganhou sete vezes o disco de platina em Portugal, vendendo mais de 350.000 cópias, e foi um dos três discos da cantora selecionados pelo jornal Público na lista de melhores álbuns portugueses.

Rui Veloso - Ar de Rock

O pai do rock português, Rui Veloso, nasceu em Lisboa, mas cresceu no Porto rodeado por música. Inspirado pela música de B.B. King, Bob Dylan e Muddy Waters, começou a estudar gaita aos seis anos de idade. Aos 19 anos, em 1976, conheceu Carlos Tê, que se tornaria seu principal parceiro e letrista de suas composições.

Foi em 1980 que montou seu primeiro projeto, o Banda Sonora, ao lado de Zé Nabo no baixo e Ramón Galarza na bateria. Foi com essa banda que Rui Veloso lançou o disco Ar de Rock no mesmo ano, um marco na história do rock português, principalmente pela música Chico Fininho. O álbum, que é uma ponte entre o rock progressivo dos anos 1970 e o que viria a ser o new wave em 1980, já apresenta algumas das principais características da carreira de Rui Veloso: letras despojadas, linhas de baixo melódicas e fervorosos solos de guitarra blueseiros.

Buraka Som Sistema - Black Diamond

Na linha da música negra de pista, é inevitável não lembrar do quinteto Buraka Som Sistema. O grupo, formado por Blaya, Branko, Kalaf Epalanga, Riot e Conductor, misturava membros portugueses e angolanos e trabalhou principalmente com o gênero Kuduro, oriundo de Angola. Buraka Som Sistema foi um dos maiores expoentes da música portuguesa no começo dos anos 2000 devido a hits como Kalemba (Wegue Wegue), Hangover (BaBaBa) e Yah!.

O single de 2008, Sound of Kuduro, com participação da britânica M.I.A., fez o grupo se destacar dentro da mídia especializada, mas foi o seu primeiro disco de estúdio, Black Diamond, lançado no mesmo ano, que fez a banda estourar. Buraka Som Sistema tornou-se um fenômeno cultural e uma afirmação da música angolana em Portugal, levando o grupo a se apresentar em cidades como Luanda, Caracas, Paris e Londres. A banda está em hiato desde 2016.

Sam the Kid - Pratica(mente)

Como falamos por aqui, o rap português nasceu nos 1990 depois do lançamento do disco Rapública (que fica como menção honrosa!). Influenciado por esse e outros discos da época, entra em cena o jovem Samuel Mira e o seu disco Entre(tanto), lançado em 1999. Anos depois, Sam The Kid (ou STK) tornou-se um dos principais expoentes do gênero em Portugal e um porta voz e fomentador da cultura hip-hop tuga.

Apesar do sucesso do primeiro disco, os fãs e a mídia especializada consideram o quarto disco de estúdio, Pratica(mente), o magnum opus da carreira do rapper. Foi o primeiro disco de Sam The Kid produzido em Lisboa com diversas participações especiais e marcado especialmente pelo uso extenso de samples, com gravações que vão de membros da sua família até mesmo a voz de José Saramago. Pratica(mente) demorou 4 anos para ser produzido, foi lançado em 2006 e angariou o disco de ouro no ano seguinte, quando chegou a mais de 10 mil cópias vendidas.

Antes de chegarmos ao último item da lista, algumas menções honrosas:

Carminho - Fado (2009)

O primeiro disco da emergente cantora portuguesa Carminho reuniu um elenco de peso e foi um das responsáveis pelo ressurgimento do fado nos anos 2010.

Bruno Pernadas - Those Who Throw Objects at the Crocodiles Will Be Asked to Retrieve Them (2016)

O segundo álbum de estúdio do compositor Bruno Pernadas mistura rock psicodélico com jazz em atmosferas cósmicas e etéreas. Com compassos alternados e texturas únicas, o disco levou o compositor a tornar-se um dos principais nomes da nova cena indie portuguesa.

MARO - hortelã (2023)

MARO é uma das artistas portuguesas mais conhecidas no exterior atualmente e, em seu último disco de estúdio, misturou folk, jazz e música brasileira. Pautado principalmente na dinâmica voz e violão, a cantora volta a lançar um disco cantado majoritariamente em português desde MARO & Manel, lançado em parceria com Manuel Rocha em 2018.

Capitão Fausto - Capitão Fausto Têm os Dias Contados

A banda Capitão Fausto, formada por Tomás Wallenstein, Manuel Palha, Domingos Coimbra, Francisco Ferreira e Salvador Sobral, se juntou em 2009 em Lisboa. Desde então, a banda tem colecionado participações em grandes festivais como o Rock In Rio e mais de cinco discos de estúdio lançados.

Em seu terceiro álbum, Capitão Fausto Têm os Dias Contados, a banda explora um som solar e mais pop do que o apresentado em seus últimos lançamentos. Talvez por influência da música brasileira (parte do disco foi gravado em São Paulo), o grupo também trabalhou com instrumentações inéditas até então, como flautas, metais e cordas, atingindo uma sonoridade mais madura que seus discos anteriores. Claro que o álbum não deixou o rock de lado, já que faixas como Mil e Quinze mostram um pouco mais da sonoridade psicodélica e rockeira que marcou a carreira da Capitão Fausto.